25.11.11

Rumo ao "nosso tempo"

«Dei ordens para irem buscar o meu cavalo ao estábulo. O criado não me entendeu. Fui eu próprio ao estábulo, selei o cavalo e montei. Ouvi ao longe o som da trombeta e perguntei-lhe o que era aquilo. Não sabia de nada, não tinha ouvido nada. Junto ao portão, fez-me parar e perguntou: «Aonde vais, senhor?» «Não sei», respondi, «para longe daqui, para longe daqui. Sempre para mais longe daqui, só poderei chegar ao meu destino». «Então sabes qual é o teu destino?», perguntou. «Sim», respondi eu, «ouviste o que eu disse: "longe-daqui", é esse o meu destino». «Mas não levas farnel», respondi eu, «a viagem é tão longa que vou de certeza morrer de fome se não me derem alguma coisa pelo caminho. Não há farnel que me possa salvar. Felizmente, é uma viagem verdadeiramente extraordinária». Franz Kafka in "A Partida"

Cada um com o seu destino, à procura do seu caminho, multiplicado pelos espelhos do tempo. Os gregos antigos definiam por chronos e kairos, aquilo a que hoje chamamos TEMPO. Enquanto o primeiro fazia referência a um tempo cronológico, sujeito à triologia clássica de passado, presente e futuro, o segundo identificava-se com “o momento certo”, aquele “tempo” em que algo de especial acontece, seja por revelação, descoberta ou introspecção. Recordo o momento em que Zaratustra obedeceu ao seu impulso para se afastar dos “homens”, resguardando-se no hiato que denominou como a “hora do supremo silêncio”. Um parêntesis que, não importa porque razão, o deteve na marcha do tempo. Posto isto, quando a realidade acontece e as decisões regressam, retoma-se a evolução do tempo. Zaratustra perplexo questionou-se sobre a transformação, a metamorfose, a revelação. Relutante, preparou-se para desbravar planícies e vales, dado que as montanhas já haviam sido cartografadas noutro tempo. Zaratustra habitava o cume dos seus próprios píncaros, se bem que sendo humilde, em relação à sua altura, conhecia bem a topografia das suas próprias impressões do terreno. Zaratustra empreendeu a descoberta do seu caminho, quando condensou os seus receios no desconhecido e na esperança, na transparência e na simplicidade, encarando a sua viagem com deslumbramento. Zaratustra regressou a si mesmo em redobrado silêncio, reunindo não só a percepção do seu caminho mas procurando, fundamentalmente, caminhar no seu tempo.
Painting: Salvador Dali - Time

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