7.12.11

Stuart MIll - A sujeição das mulheres

Fra Angelico - Noli me tangere - 1440/1
Não sei se a subjugação das mulheres, numa sociedade essencialmente masculinizada não terá surgido com o mito cristão, criado à volta do momento do renascimento de Jesus Cristo, quando este se dirigiu à primeira pessoa que o reconheceu e lhe disse “Noli me tangere”. O curioso é que, segundo contam as escrituras, poucos momentos depois de Maria Madalena ter sido impedida de comprovar a ressusseição do Senhor, ao que parece, foi o próprio Jesus Cristo que sugeriu a Tomé que lhe colocasse as mãos nas feridas de modo a exortar o seu regresso à Terra. Apesar das interpretações das escrituras poderem ser diversas, em relação a estes episódios, o facto é que, estou convencida que o Cristianismo atribui, maioritariamente, em todos os Evangelhos, um papel submisso e secundário às mulheres, facto que as obrigou a um trabalho de afirmação faraónico ao longo da história. Contam-se pelos dedos as mulheres que tiveram papéis de relevo na história medieval e renascentista. A memória não é fértil em Joanas D’Arc, Elisabeth I, Catarinas da Rússia ou Terezas de Habsburgo. O papel da mulher foi relegado, ao longo da história, para segundo e terceiro plano, cabendo-lhe a posição do quarto dos fundos, qual barata kafkiana, remetida ao isolamento dos proscritos, apesar da lenda dizer que atrás de cada homem há sempre uma grande mulher. Por outro lado, poucos foram os homens iluminados que perceberam que projectar as “linhas de defesa da retaguarda”, só beneficiaria o todo social, criando aquilo a que Stuart Mill denominou no seu livro “The Subjection of Women” : “a possibilidade de duplicar o coeficiente de faculdades mentais disponíveis em proveito da humanidade”. Mill (1806-1873) foi um precursor admirável para o seu tempo, ao entender que a subjugação da mulher, ao sexo oposto, constituía um dos obstáculos ao progresso da humanidade, devendo ser-lhes proporcionadas as mesmas oportunidades e o livre uso das suas faculdades no que toca à livre escolha dos seus percursos pessoais e profissionais. Havia que revirar o palco das mentalidades, subvertendo teorias como aquelas que lemos nas criticas de Walter Besant, em 1897:

“A jovem de 1837 não consegue raciocinar acerca de nenhum assunto, qualquer que ele seja, devido à sua ignorância – como ela própria diria, por ser uma mulher. [...] Ser infantilmente ignorante; [...] não saber nada acerca de Arte, da História, da Ciência, da Literatura, da Política, da Sociologia, das Boas Maneiras – aos homens aprazia-lhes este estado de coisas, as mulheres tornavam-se submissas para agradar aos homens; a sua própria ignorância constituía um assunto de louvável orgulho para a mulher inglesa dos anos quarenta”.

Suart Mill defendia, estoicamente, que o ónus da prova deveria recair sobre os que advogavam restrições ou proibições à liberdade de acção humana, ou uma qualquer desqualificação ou disparidade de privilégios, cabendo a presunção à priori a favor da liberdade e da imparcialidade. E conclui que, "não deverão impor-se restrições que não sejam exigidas pelo bem comum, não devendo a lei descriminar as pessoas, mas sim tratá-las todas de igual forma, salvo quando o tratamento diferenciado ocorrer por motivações de justiça social ou políticas". Mill foi um visionário do equilíbrio social, um activista das mentalidades orwelianas da época que, por rivalidade ou preconceito, subestimavam a capacidade natural das mulheres, relegando-as para as tarefas pedagógico-familiares, inviabilizando-lhes o acesso ao conhecimento e aos mecanismos essenciais ao crescimento intelectual. Com o advento das duas Grandes Guerras o papel social da mulher seria catapultado para o lugar que lhe estava destinado, contudo, apesar do progresso, a conquista, ainda hoje é frequentemente efectuada a pulso, não sendo, em alguns sectores, muito diferente do que Mill preconizava: "...os indivíduos do sexo masculino têm acesso a todas as posições, honrarias e vantagens sociais. Por mais humildes que sejam as suas origens, têm apenas que se defrontar com obstáculos naturais, o mesmo já não se passa com as mulheres." que se vêm obrigadas a um crivo de prestação de provas intelectuais, facto que, só após a aprovação masculinizada do evento, terão a possibilidade, e a inolvidável honra, de acederem ao Gentleman's Corner.

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