"Renuncio a fazer perguntas, (...) Mas não descanso; sinto-me ameaçado, traído, a cada instante pronto para me contrair num espasmo de defesa. (...) Em redor, tudo nos é hostil. (...) Na marcha de saída e de regresso nunca faltam os SS. Quem poderia negar-lhes o direito de assistir a esta coreografia que eles próprios quiseram? (...) A faculdade humana de cavar um nicho para si, de segregar uma carapaça, de levantar à sua volta uma ténue barreira de defesa, mesmo em circunstâncias aparentemente desesperadas, é espantosa e mereceria um estudo aprofundado. Trata-se de uma preciosa capacidade de adaptação, em parte passiva e inconsciente, em parte activa (...) estipular pactos tácticos de não agressão com os vizinhos; intuir e aceitar hábitos e as leis (...) Então nasce dentro de mim uma pena desoladora (...) é uma dor no seu estado puro, não temperada pelo sentido da realidade, pela intrusão de circunstâncias estranhas (...) Como entender tanta cegueira e tanta desumanidade? E como interpretar os resultados da discricionariedade pura? (...) apesar do reduzido número de sobreviventes, foram registados muitos testemunhos (...) Primo Levi in "Se Isto é Um Homem"
Primo Levi é um dos poucas sobreviventes dos 3 milhões de judeus assassinados em Auswitch. Contra todas as expectativas preconizadas pela "Solução Final", Primo Levi sobreviveu para testemunhar as atrocidades do maior campo de extermínio que alguma vez existiu na História da Humanidade. O seu relato objectivo reflecte a sua luta diária pela sobrevivência, num meio hostil, onde princípios, valores e o próprio homem, nada contam. Primo Levi relata com uma clarividência admirável o processo premeditado, sistemático, incisivo, persistente e continuado que se arrastou, durante quase dois anos da sua vida, no campo de trabalhos anexo a Auswitch. Em todos os livros que tenho lido sobre o tema, em nenhum consegui encontrar respostas para as questões que qualquer ser humano, dotado do bom senso do "bonus pater familias" colocaria. Retiro, de todas estes contributos históricos, apenas os objectivos nazis: a atomização da sociedade judaica, a supressão de todas as liberdades passíveis de um ser humano usufruir, a constituição de guetos físicos e espirituais, a destruição aleatória de testemunhas, a atrocidade cruel de silenciar pessoas. Em nenhum livro encontrei resposta para o problema que abalou o início dos anos 30. A erradicação dos judeus da vida pública alemã, as perseguições, a segregação. O culminar dos acontecimentos na famosa Noite de Cristal, em 39, quando mais de 500 mil judeus foram obrigados a fugir do país. A que é que se deveu toda esta segregação? Porquê os judeus e não os romenos, ou os russos, ou os italianos? Seria porque detinham a maior parte do capital? Por razões religiosas? Pura ostracização? Ódio?
Quanto às imagens da "Lista de Schindler", não são imagens reais. Da época. É apenas uma ficção. Ficção essa que, alguns meses após a sua estreia, levou Spielberg a confessar que tinha sido o filme que realizou que mais profundamente tinha afectado a sua vida. Contudo, trata-se só de uma ficção.
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