Vincent Van Gogh - 1889 - Wheatfield with Cypresses |
"How beautiful those old almshouses are, I can't find words to describe them. And though Israëls does this sort of thing to perfection, so to speak, I find it strange that so relatively few should have an eye for it. Every day here in The Hague, so to speak, I see a world which very many people pass by and which is very different from what most make of it".
- Letter from Vincent van Gogh to Theo van Gogh - The Hague, 21-28 March 1883
Julgo que haverá sempre um marco determinante para justificar o interesse que passamos a ter por algum tema. No caso de Van Gogh terá sido, certamente, a exposição que decorreu em Londres, no início de 2010, intitulada "The Real Van Gogh and his Letters"- aqui e aqui - e que divulgou a correspondência do autor, onde se incluem mais de 800 cartas trocadas, na sua maioria, com o seu irmão mais novo Theo. A escrita de Van Gogh, directa, transparente e de uma honestidade plasmada por temperamentos que variam entre o luminoso efusivo e o melancólico sombrio, assume a complexidade do movimento das portas entreabertas. Da obscuridade, passamos para uma dimensão espaçosa de luz que deixa antever as casas de cores flamejantes, os corvos que sobrevoam o feno, as árvores que contêm gente dentro que fala pelos troncos nus e secos, numa mistura caótica de alegria e sofrimento contido na solidão de quem procura erguer o manto da revelação onde se escondem sentidos indolentes e adormecidos.
Vincent mostra-nos o luar intenso, o crepúsculo dos dias e a porta secreta para o universo que se esconde por detrás dos olhos do artista. Para lá da impressão digital deixada nas telas, para lá do vibrante das cores e do cinzento da melancolia, o mundo literário de Van Gogh assume uma natureza confessional que encontrou no irmão Theo o destinatário do seu ponto de fuga, convergindo todo o seu tumultuoso mundo para esse determinante ponto de equilíbrio. Quando, em 1873, Van Gogh é convidado pelos sócios da empresa gráfica onde trabalhava, a "Goupil & Cie, com sede em Haia, a deslocar-se para a sucursal de Londres, parte com a promessa a Theo de "escreverem imensas cartas um ao outro" dando voz à convicção que a pintura e a escrita estão na génese das pontes entre a arte e a realidade.
Do diálogo estabelecido, beneficiamos de um eloquente conjunto fotográfico que incide sobre temas tão diversos como a escolha das cores ou as circunstâncias que geraram determinada obra. Em detalhe, para além das referências de carácter emotivo e pessoal, a linguagem utilizada sugere, como fonte inspiradora, as obras literárias de escritores famosos, como é o caso de Emile Zola, entre outros.
Nos últimos anos, o interesse pela correspondência de Van Gogh tem sido crescente, não só pela franqueza de um mundo interior atribulado mas também pelo testemunho, directo e inquestionável, da sociedade da época que evoca as grandes dificuldades que se seguiram à revolução industrial com os campos desertificados e uma classe de camponeses que subsistia abaixo do limiar da pobreza.
Van Gogh coincidiu novamente no meu percurso quando me deparei com um livro de poemas de Annie Dillard, construído a partir da ideia original de recolha de frases emocionalmente fortes que resultassem num todo poético. Feito a partir de excertos de diversas obras literárias famosas, foi precisamente o poema retirado das palavras de Van Gogh que me suscitou maior interesse, pela nostalgia que tão bem representa o percurso do artista.
"I am Trying to Get at Something Utterly Heartbroken"
(constructed from passages in van Gogh's letters)
A ploughed field with clods of violet earth;
Over all a yellow sky with a yellow sun.
So there is every moment something that moves one intensely.
A bluish-grey line of trees with a few roofs.
I simply could not restrain myself or keep
My hands off it or allow myself to rest.
A mother with her child, in the shadow
Of a large tree against the dune.
To say how many green-greys there are is impossible.
I love so much, so very much, the effect
Of yellow leaves against green trunks.
This is not a thing that I have sought,
But it has come across my path and I have seized it.
Annie Dillard in Mornings Like This (1996)
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