4.3.13

Café en vogue

Edgar Degas - 1875/6 - L'Absinte
“L’Absinthe” seria, aparentemente, um quadro insusceptível de história, onde o alcoolismo e a passividade irracional dos figurantes exaspera o observador adepto do impressionismo tranquilizante dos grandes espaços. Mas, a história viria a convergir as suas polémicas sobre o tema, boémio, inebriante e decadente, quando Degas expôs, em 1893, a sua colecção na Grafton Gallery, em Londres. Alargando as margens do rio impressionista, Degas abriu portas a uma realidade incómoda que se escondia nos bastidores do recolhimento boémio, escancarando a tristeza submersa nas personagens cinzentas, retratando-as de olhares perdidos no infinito, ausência de força anímica e vidas que sufocam nos últimos redutos de águas estagnadas. A sociedade britânica, impoluta, e em contínua evolução da sua miopia, criticou duramente os temas de Degas, desvalorizando o interesse no close up que retratava a vida nocturna parisiense, e a ressaca de dois alcoólicos, despropositada aos bons costumes vitorianos. 
Lembrei-me deste episódio depois de ler uma série de livros dos quais fiquei com a impressão que o paradoxo das metamorfoses do tempo recai na ficção porque é uma realidade. Ao contrário da inércia das figuras derrotadas de Degas, encontrei sopros de vida numa série de personagens. Em comum, a procura de um sentido para a vida, a busca de uma identidade que transacciona com o tempo e as memórias, não em conflito, mas numa óptica de reconciliação com o passado, num presente cuja plenitude se pinta de cores vibrantes. “A Identidade” - Milan Kundera, "Viagem à India" - Gonçalo M. Tavares, “Ano Sabático” - João Tordo, “O Regresso do Hooligan” - Norman Manea, “O Feitiço da India” - Miguel Real, “Waldon ou a Vida nos Bosques" – Henry-David Thoreau, “Renascer” - Susan Sontag. Todos em comum criam urgências sobre a dialéctica entre a memória, o esquecimento e a revelação de um caminho. 

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