22.11.09

Recordações

Quando no mesmo ano desaparecem duas das pessoas mais importantes da nossa vida vemo-nos, inesperadamente, aos fins de semana, a colectar espólios que fizeram parte da nossa infância. De um momento para o outro, tudo aquilo em que mexemos, trás-nos à memória flashes de uma infância feliz. As leituras de fim de semana da "Colecção Cosmos". O desfolhar dos grandes volumes do "Mosquito". As enciclopédias, La Rousse, inglesas, a Luso Brasileira, os clássicos. A colecção de selos, desde os anos 40, acondicionada em peliculas da HAMA e que eu gostava tanto de ajudar a organizar. Passam-nos pelos dedos recordações de dias felizes, sentados à volta do meu pai a ouvir as suas histórias. O meu pai foi das pessoas mais cultas que conheci em toda a minha vida. Foi professor universitário mais de 40 anos, para além de milhentas coisas que fez e de cargos públicos que exerceu. Mas, julgo que aquilo que retenho é a imagem de um pai afável, bom, generoso e que, sem dúvida, constituíu uma referência na minha vida. Sem tempo para nada, era resgatado por mim e pelo meu irmão, aos fins de semana, não lhe deixando muito tempo para a preparação das suas aulas. Guardo, com muito carinho, a imagem de um pai extremamente simples, tolerante, com o qual os meus amigos adoravam conversar. Tinha uma capacidade invulgar de se adaptar a qualquer cenário, de enfrentar tranquilamente qualquer adversidade, de ouvir qualquer pessoa, culta, inculta, rica ou pobre. Sem dúvida que nos transmitiu esses valores. É curioso, o que o manuseamento de um espólio nos faz recordar.

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