Já tinha cativado a minha atenção em Amsterdão e foi um dos quadros eleitos para ir até à exposição de Londres. É a obra do pintor que mais me impressiona. Talvez pelas cores melancólicas que oscilam entre os cinzentos e os negros, a intensidade dramática e a rudeza das personagens. Rostos tristes e inertes que denotam uma apatia de emoções face a uma pobreza que deixa antever um limiar de sobrevivência. “The Potato Eaters” é uma das obras mais famosas de Van Gogh e aquela que confessaria, anos mais tarde, ser a sua preferida. Van Gogh deslocou-se para a zona rural de Nuenen, no Norte da Holanda, - onde viveu entre 1883-85 - com o intuito de efectuar estudos da anatomia humana socorrendo-se dos camponeses dessa pequena comunidade, já que a sua precária situação económica não lhe permitia contratar modelos para o efeito. A passagem por Nuenen viria a tornar-se o local da descoberta dos seus traços e do seu estilo singular, da vontade de retratar sem recurso ao embelezamento das personagens - afastando-se assim do seu mentor Millet -, bem como da escolha dos elementos naturais que caracterizariam muitas das suas obras. Em Nuenen, Van Gogh procurou retratar fielmente as expressões das gentes, a rudez dos corpos, a feiura das caras, a tristeza impregnada na pobreza dos camponeses do norte que pouco mais tinham para comer do que uma refeição de batatas. Quando observei este quadro pensei que de certa forma resumia todo um quadro social trágico, que caracterizou os finais do século 19, marcado por pobres assalariados e camponeses miseráveis que viviam numa luta trágica e diária pela sobrevivência, reverso social da revolução industrial e da desertificação rural. Neunen, daria origem a dezenas de obras e ensaios de Van Gogh. Planícies de terra negra que se fundem em horizontes melancolicamente cinzentos. Cores que nunca se afastam da escuridão e da tristeza dos dias. Van Gogh referiu-se nas suas cartas a Theo a estes tons com deslumbramento e entusiasmo, confessando anos mais tarde à sua irmã que “The Potato Eaters” teria sido a sua obra mais bem conseguida, suscitando-me essa afirmação uma antevisão quase trágica do seu destino. Para finalizar esta passagem por Van Gogh diria do que li que a sua fama meteórica poderá ser dissecada em dois grandes vectores. Primeiro, as qualidades intrínsecas do seu trabalho e o carácter inovador que o mesmo trouxe ao panorama pós-impressionista dos finais do século 19. Pinceladas robustas e vibrantes que oscilam numa paleta de cores entre os tons depressivamente escuros - quase numa antevisão trágica da sua vida – e os amarelos fortes – visíveis na série de 7 quadros com Girassóis que Van Gogh pintou para a casa amarela de Arles. Em segundo lugar, o mito em que se transforma o homem e que apela à imaginação de todos nós. Um homem que nunca foi reconhecido em vida e sacrificou tudo pela sua arte. O homem que viveu na pobreza e universalmente incompreendido. O pintor que apenas conseguiu vender um único quadro em vida, “A Vinha Encarnada”, por 400 francos. Aglutinados no mito ficam os factos que conhecemos, a história trágica e a ficção que os mesmos factos nos sugerem. Mas, mais importante que tudo ficou o seu legado, um conjunto de mais de 900 quadros e 1000 desenhos bem como, a sua “second oeuvre”, as suas cartas, ponte entre o homem e a sua história, entre os seus quadros e a sua solidão.
11.4.10
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1 comentário:
Dear TI, thank you for this wonderful post.It is very interesting because of the story but also because of the connection it makes to my story of liking Van Gogh.
When I was little my parents had a series of books on art and as all children are attracted to colourful illustrations - so was I attracted to those books. One of them was a book about Van Gogh and 'The Potato Eaters' was one of the first paintings displayed and described in it. For me it was too dark and gloomy and I couldn't understand it. So I kept coming back to that book and stopping to look at the pictures straight after this painting. I remember it so well!
Then of course with time I saw other pictures in the book - and got completely mesmerised by 'The Starry Night' and 'The Sunflowers' by all those vibrant strokes and colours and all the sheer movement which uniquely can be only seen on HIS works...
And you know, I have seen the original of 'The Red Vineyard' in Moscow museum and it is impressive but far not the most impressive of his works. Why this one? I mean how could nobody see what we see now in those paintings? But most importantly how could a person who was so utterly unsuccessful an unaccepted kept doing what he was doing and never destroyed his own works and never doubted the purpose of his life and works. THAT is what amazes me most!
I hope you are having a lovely time, TI. I'm with you in my thoughts.
take care and have fun :)
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